Conversa de xadrez (2) – a dança do roque

– É a minha vez de avançar – confirma a dama, toda de branco, que acenando ao seu impávido e imperturbável rei, se desloca velozmente, com todo o seu séquito, quatro linhas adiante para a casa h-5.
– Vai em paz nobre rainha. Que o nosso sacrifício seja a tua salvação.
Apre! Certos soberanos, homens de barba rija, sempre viram a história às avessas.
As pretas defendem-se como podem, mandando recuar o cavalinho que havia aniquilado o peão de brega, para agora ocupar uma posição anticlerical. O bispo contrário defende-se, mas não dá a face, desliza antes um passo trás. A posição f-7, bem perto do rei negro está sob pressão. Ele sente-a.
– Avance uma casa na diagonal – ordena o rei preto, em tom aborrecido, ao sempre obediente prelado que o ladeia.
– Ande lá! Está a atrapalhar-me pontífice. Não vê?
– Sua Majestade real tenha cuidado com as suas saídas sob o manto da escuridão. O pecado espreita-nos – adverte o diligente bispo.
– Deixe-se disso homem. Quero apenas dançar o roque, mas é com a fria e altaneira torre. Vossa alteza a Rainha dá-me licença?
– Por quem sois, meu nobre Rei, tenho plena confiança em vós – responde aquela que fora educada pelas melhores aias da corte austríaca em quatro línguas estrangeiras.
As brancas, corteses, fazem o lance seguro e premonitório, dando assim oportunidade para o adversário iniciar a sua dança real. O Rei preto move-se, enfim, com a sua torre, aos acordes do roque, bem ritmado.
No outro extremo do tabuleiro lamenta-se invejoso o rei branco.
– Onde estais minha rainha? Porque me abandonáreis ingrata? Estou só na corte.
Ah! Eis que ele finalmente nota a falta que as damas fazem no Mundo.
(continua)
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